Pular para o conteúdo principal

O que faltava ao peixe é o que NÃO falta no livreto

76 páginas! 
Nada mais. 

Textos curtíssimos e censo de lirismo apurado fazem parte do livro O que faltava ao peixe (Editora Libretos, 1ª Edição, 2011, 76 páginas, Ilustrações de Aline Daka, R$23, 00).
São 14 contos que mais parecem textos em prosa com linguagem poética, tamanha a sensibilidade da escritora em retratar coisas simples, tais como açúcar, caracol e claro, peixe. O livro é de um lirismo que ultrapassa as fronteiras de um prosador. Temas como velhice, solidão, infância e morte fazem parte das histórias, ora tristes, ora cheias de ternura, bem como a nossa vida, celebrada aqui com a simplicidade das historietas. 

É assim com o primeiro conto do livro onde a moça que nunca arranjou marido quer filha e sonha, sonha muito. "Da pior ternura" já é um conto mais realista, mas nem por isso menos singelo. Mistura desenhos e a inocência de uma mulher que adora receber flores gardênia porque acha o nome bonito e escrever "Saudações" nas cartas que tece. Em "O fazedor de guarda-chuvas", o conto foi pra mim uma espécie de ápice do livro. Todo mundo já ficou um tempo, nem que seja por pouco tempo pensando enquanto a chuva cai lá fora. E é este o acontecimento deste conto. 
Se Ana Santos transpusesse seus contos para a forma de verso, seria não acidentalmente comparada à Adélia Prado. A semelhança entre as duas é pouca, mas há. Os textos de Ana são delicados, têm metáforas contidas nas entrelinhas, remetem a tempos que vivemos no interior na companhia de nossos pais, avós e familiares. São dias de chuva, dias nascença e de morte que permeiam as páginas.
O livro de Ana Santos foi selecionado pela Bolsa FUNARTE de Estímulo à Criação Artística – Categoria Criação Literária e financiada pelo FUMPROARTE/SMC da Prefeitura de Porto Alegre.
Nada mais merecedor a esta jovem escritora que estreia no mundo da Escrita com um livro que pode faltar ao peixe, mas não ao sucesso da escritora.


_______________________________________________________

Ana Santos nasceu em 1984, em Porto Alegre, onde mora e trabalha como professora de inglês. Estudou jornalismo na UFRGS e cursou oficina de criação literária da PUCRS. Participou também de duas oficinas de escrita criativa na Universidade do Colorado - Boulder. Em 2008 foi contemplada com a Bolsa FUNARTE de Estímulo à Criação Artística, na categoria Criação Literária. Tem contos publicados na revista Bravo!, Cult e Ficções.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

[Curiosidades] Xingamentos em um português culto

Se é pra xingar, vamos xingar com um português sofisticado. Aqui neste post você vai ler algumas palavras mais cultas e pouco usadas quando se quer proferir uma série de palavrões onde a criatura não entende patavina nenhuma. Antes, porém, de você aprender algumas palavrinhas, conheça esta historieta: Diz a lenda que Rui Barbosa, ao chegar em casa, ouviu um barulho estranho vindo do seu quintal. Chegando lá, constatou haver um ladrão tentando levar seus patos de criação. Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o ao tentar pular o muro com seus amados patos, disse-lhe:  - Oh, bucéfalo anácrono!Não o interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo; mas se é para zombares da minha elevada prosopopéia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com minha bengala fosfórica bem no alto da tua sinagoga, e o

Resistência do amor em tempos sombrios

Terceiro e último livro de uma trilogia que a escritora gaúcha iniciou com A casa das sete mulheres, o volume Travessia encerra a Trilogia Farroupilha com um personagem que, no dizer da autora, é comum a toda a história: Garibaldi, este carismático personagem que aparece no início do primeiro livro, quando principia um amor platônico com a meiga Manuela, a filha do Bento Gonçalves. Mas como já acompanhamos nos volumes anteriores, a família da moça não compactua com o romance, impedindo, pois, o contato de ambos. Se no primeiro livro a escritora se atém a contar a história da família concomitante à Revolução Farroupilha, tendo como cenário a Estância da Barra, a casa na qual ficaram 7 mulheres da família de Bento Gonçalves, no segundo volume já temos como plano histórico a Guerra do Paraguai, além de mudar a perspectiva para o romance de Giuseppe e Anita, a mulher atemporal que provoca uma paixão no general e guerreiro italiano. Ana Maria de Jesus Ribeiro, ou Anita, sempre dava um

De Clarice Lispector para Tania Kaufmann

Conforme eu tinha anunciado ha meses, o blog Papos Literários divulgará com frequência uma série de cartas famosas do mundo da literatura ou da música. Hoje trago na íntegra a carta de uma das escritoras mais queiridinhas dos brasileiros, além de ser famigerada nestes tempos de facebook ee twitter. Confira a f amosa carta de Clarice para a sua irmã Tania Kaufmann. Clarice em sua árdua tarefa de escrever _____________________________________________ A Tania Kaufmann Berna, 6 janeiro 1948 Minha florzinha, Recebi sua carta desse estranho Bucsky, datada de 30 de dezembro. Como fiquei contente, minha irmãzinha, com certas frases suas. Não diga porém: descobri que ainda há certas frases suas. Não diga porém: descobri que ainda há muita coisa viva em mim. Mas não, minha querida ! Você está toda viva! Somente você tem levado uma vida irracional, uma vida que não parece com você. Tania, não pense que a pessoa tem tanta força assim a ponto de levar qualquer espécie de vida e continuar