Pular para o conteúdo principal

Um romance não concretizado


O deserto do amor (Le désert de l’amour)
Autor: François Mauriac
Tradução:Rachel de Queiroz
Capa: Leonardo Laccarino
Páginas : 182
Editora José Olympio (Grupo Editorial Record)




Em O Deserto do Amor, Mauriac traz um triângulo amoroso envolvendo os homens Courrèges, Paul e Raymond ( que são pai e filho) e Maria Cross. Esta foi paciente de Paul e primeiro amor de Raymond. Você pode pensar que até aí não há nada demais, posto que tantos outros já falaram sobre este assunto. O que torna esta obra especial não é o triângulos amoroso em si , mas a ideia que cada personagem faz do ser amado. Não é sobre que se ama, é sobre como cada um se relaciona com o amor.

Paul é médico alheio à família, atende Maria quando esta encontra-se "enferma da alma". A personagem, após a viuvez se vê em maus lençóis financeiros, aceitando se relacionar com um homem casado e mais velho para obter ajuda financeira para cuidar do filho pequeno. Acaba perdendo a criança para a enfermidade e se vê sozinha e mal falada pela cidade. Raymond é um jovem rebelde de 17 anos e ao encontrar com Maria no bonde desenvolve um amor platônico por ela.

Para Paul, Maria é uma santa. É mulher doce , sensível, incapaz de agir de má fé ou com outros maus hábitos. Para Maria, cujo objeto de afeição será Raymond, o rapaz representará toda a beleza e pureza que ela via em seu pequeno filho, que tão cedo perdeu a vida. Já Raymond, encanta-se com a beleza de Maria mas a vê com os olhos da sociedade e crê que ela não passa de uma vigarista, "uma qualquer".

O Deserto do Amor é um livro de Romances não concretizados. Os personagens aprisionam todos os sentimentos para si e levam suas vidas pautadas pelas consequências do amor:

"Nós todos fomos amassados e reamassados por aqueles que nos amaram, e, por menor que tenha sido a tenacidade deles, somos sua obra - obra que, aliás, eles não reconhecem, e que não é nunca a obra com que sonharam. Não há amor, não há amizade que atravesse o nosso destino sem colaborar com ele pela eternidade. O Raymond Courrèges daquela noite, no pequeno bar da rua Duphot, aquele moço de 35 anos, seria um homem diferente se em 19... quando estudante de Filosofia, não visse sentar-se diante de si, no bonde de volta, Maria Cross." (p.056)

Doutor Paul, tomado pela angústia de nunca declarar seus sentimentos e com vontade de esquecer, afunda-se no trabalho e afasta-se da família, ao mesmo tempo que reconhece a nobreza de sua esposa, pois esta devolve sua indiferença sempre com mais dedicação e cuidados. Raymond, diante da humilhação sentida ao ser rejeitado por Maria, torna-se um bom vivant, um sedutor e carrega em si o desejo de vingar-se daquela que o esnobou. Maria, aceita seu destino e casa com aquele que a vida pôs para ampará-la, sem possuir mais ninguém a quem ela sinta amor.

Publicada em 1925, a obra recebeu tradução de Rachel de Queiroz e mantém-se atual tratando de enfermidades e vícios, da surda inquietação da juventude, das tentações falazes da carne , do ciúme descortinado - eis as tramas que envolvem este que é um dos mais importantes romances de Mauriac.



SOBRE O AUTOR: 

Iniciou sua carreira em 1909, com um livro de poemas ("Les Mains Jointes"). Publicou estudos biográficos e críticos, colaborou também em revistas e jornais franceses, tendo mantido por muitos anos seu "Bloc Notes", coluna publicada inicialmente no jornal La Table ronde, depois no Le Figaro, e a partir de 1955 na revista L'Express. François Mauriac entrou para a Academia Francesa de Letras, em 1933, ocupando a cadeira 22.
Entre suas obras de cunho crítico se encontra um famoso ensaio contra a pena de morte, que levou a uma coleta de assinaturas pelo fim da pena de morte na França, após a Segunda Guerra Mundial


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

[Curiosidades] Xingamentos em um português culto

Se é pra xingar, vamos xingar com um português sofisticado. Aqui neste post você vai ler algumas palavras mais cultas e pouco usadas quando se quer proferir uma série de palavrões onde a criatura não entende patavina nenhuma. Antes, porém, de você aprender algumas palavrinhas, conheça esta historieta: Diz a lenda que Rui Barbosa, ao chegar em casa, ouviu um barulho estranho vindo do seu quintal. Chegando lá, constatou haver um ladrão tentando levar seus patos de criação. Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o ao tentar pular o muro com seus amados patos, disse-lhe:  - Oh, bucéfalo anácrono!Não o interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo; mas se é para zombares da minha elevada prosopopéia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com minha bengala fosfórica bem no alto da tua sinagoga,...

Como fazer um livro artesanal em casa

Se você já teve aquela ideia de transformar um caderno de receitas em livro, ou ainda um diário, um bloco de anotações, siga estas instruções e veja como dar uma capa hardcover totalmente customizada a seu gosto. Abaixo, o tutorial passo a passo de como fazer uma maravilhoso livro artesanal. Método 1 de 2: Encadernação com Cola e Tecido 1  Escolha um material para a capa e corte duas peças idênticas. Para o seu primeiro livro, a cartolina é bem fácil de trabalhar. Uma vez que você já tenha pegado o jeito, poderá avançar para a madeira ou um tabuleiro. A capa precisa ser 6 cm mais larga e 1.25 cm mais longa que as páginas internas. Se você está usando papel de impressão, ele deve ter 22.25 x 29.25 cm. 2 Dobre seis folhas de papel pela metade. Depois, costure-as juntas no vinco, em um padrão de algarismo 8. Certifique-se de começar e terminar no mesmo ponto, e que o nó fique para dentro. Isto irá criar uma lombada de livro. 1/4" (.6 cm) é uma largura adequada. 3 Empilhe al...

Resistência do amor em tempos sombrios

Terceiro e último livro de uma trilogia que a escritora gaúcha iniciou com A casa das sete mulheres, o volume Travessia encerra a Trilogia Farroupilha com um personagem que, no dizer da autora, é comum a toda a história: Garibaldi, este carismático personagem que aparece no início do primeiro livro, quando principia um amor platônico com a meiga Manuela, a filha do Bento Gonçalves. Mas como já acompanhamos nos volumes anteriores, a família da moça não compactua com o romance, impedindo, pois, o contato de ambos. Se no primeiro livro a escritora se atém a contar a história da família concomitante à Revolução Farroupilha, tendo como cenário a Estância da Barra, a casa na qual ficaram 7 mulheres da família de Bento Gonçalves, no segundo volume já temos como plano histórico a Guerra do Paraguai, além de mudar a perspectiva para o romance de Giuseppe e Anita, a mulher atemporal que provoca uma paixão no general e guerreiro italiano. Ana Maria de Jesus Ribeiro, ou Anita, sempre dava um ...