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Questionário de Proust por ele mesmo

Lá pelos idos de 1886, o então futuro escritor, na época com treze anos de idade, estava na festa da prima, Antoinette, e foi convidado a preencher um questionário. Era uma "modinha", como se diz, uma brincadeira que teve origem na Inglaterra vitoriana, e que consistia numa diversão de salão chamada “Confissões”, na qual os participantes respondiam a uma pequena lista de perguntas pessoais. Essa se tornou uma brincadeira bastante comum nos refinados salões da Belle Époque, e se tornou uma fonte de assuntos e de animações para as festas, uma forma original de entreter os convidados.

Proust respondeu ao mesmo questionário duas vezes na vida, a primeira quando era menino, aos treze anos de idade, e outra, já um rapaz de vinte anos, quando servia o exército francês. As respostas do gênio da literatura francesa tornaram o modelo de questionário tão famoso que virou uma espécie de padrão até de entrevistas jornalísticas! Hoje, o pouco que se sabe da vida pessoal de Proust foi praticamente “deduzido” dos questionários respondidos, reencontrados pelo filho da prima Antoinette, e publicados em 1924.”


Respostas do Proust aos 13 anos

O principal traço da minha personalidade: A necessidade de ser amado e, para ser mais preciso, mais a necessidade de ser acarinhado e mimado do que a necessidade de ser admirado.

A qualidade de que gosto num homem: Alguns encantos femininos.

A qualidade de que gosto numa mulher: Virtudes masculinas e a franqueza na camaradagem.

Aquilo que mais aprecio nos meus amigos: Que sejam ternurentos comigo, se a sua pessoa for suficientemente delicada para atribuir valor à sua ternura.

O meu principal defeito: Não saber, não poder «querer».

A minha ocupação preferida: Amar.

O meu ideal de felicidade: Receio que ele não seja elevado o bastante, não me atrevo a dizê-lo, tenho medo de o destruir ao verbalizá-lo.

Qual seria a minha maior infelicidade: Não ter conhecido a minha mãe e a minha avó.

Aquilo que gostaria de ser: Eu, como as pessoas que admiro gostariam que eu fosse.

País onde eu gostaria de viver: Aquele em que certas coisas que eu desejaria se realizassem como que por magia e onde a ternura seria sempre retribuída.

A cor de que mais gosto: A beleza não se encontra nas cores, mas na sua harmonia.

A flor de que mais gosto: A dela — e, depois, todas as outras.

O pássaro de que mais gosto: A andorinha.

Os meus escritores de prosa preferidos: Atualmente, Anatole France e Pierre Loti.

Os meus poetas preferidos: Baudelaire e Alfred de Vigny.

Os meus heróis na ficção: Hamlet.

As minhas heroínas preferidas na ficção: Bérénice.

Os meus compositores de eleição: Beethoven, Wagner, Schumann.

Os meus pintores preferidos: Leonardo da Vinci, Rembrandt.

Os meus heróis na vida real: M. Darlu, M. Boutroux.

As minhas heroínas na História: Cleópatra.

Os meus nomes preferidos: Só tenho um de cada vez.

Aquilo que mais detesto: As minhas piores características.

Personalidades históricas que mais desprezo: Não sou suficientemente culto.

O feito militar que mais admiro: Ter-me alistado como voluntário!

A reforma que mais estimo: [sem resposta]

O dom natural que gostaria de ter: A vontade e algum poder de sedução.

Como gostaria de morrer: Melhor do que sou, e amado.

Estado presente do meu espírito: O aborrecimento de ter pensado em mim para responder a todas estas questões.

Os erros que me inspiram mais indulgência: Aqueles que consigo compreender.

O meu lema: Receio que, se o disser, ele me traga infelicidade.

O título é do próprio Marcel Proust. 
Proust deve ter respondido a este questionário na época em que se ofereceu como voluntário, ou um pouco depois disso. (Alistado como voluntário de 15 de novembro de 1889 a 14 de novembro de 1890.)

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