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Poesia Nossa de Cada Dia - Luta + vã

Em "Luta + vã" Álvaro Santi faz dança com as palavras

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Antes de mais nada, a antologia de poemas do autor gaúcho é um retorno incompleto ao que ele escreveu no passado, pois o livro Luta + vã (Álvaro Santi, Editora Libretos, 1ª Edição, 2012, 128 páginas, R$ 15,00), cujo título foi propositalmente retirado de um velho poema conhecido de Drummond, é uma empreitada do escritor de reunir poemas inéditos e outros escritos no início da década de 90.
Não conhecia a poesia do Álvaro Santi, mas deu pra perceber que é leve e doce. O organizador da antologia já anuncia no prefácio ser um livro onde a seleção dos poemas do escritor vai se estreitando com a divisa "make it new" feita por Ezra Pound.
O escritor é um artesão que dá som aos versos. Talvez porque ele seja músico e isso influencia de certa forma a escrita dos seus versos.
Escolhi o poema "Meio-dia" para fazer parte da coluna "Poesia Comentada" aqui do blog.
Então, vamos lá. Leia primeiro o poema!



MEIO-DIA

Sol a pino
Olhar fixo no prato
Está sentado o homem
Imerso no burburinho
De um restaurante qualquer

Há centenas de coisas
A serem feitas à tarde
E as que não foram de manhã

Tão estranho pedir-lhe
Que saboreie o almoço

Ativo burguês
Corre em torno de si

E corre em busca do quê?
Azeite nas juntas
Energia e decisão


-A conta, por favor!

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POESIA COMENTADA, por Thiago Felício:

Quando li no prefácio da obra a comparação feita pelo organizador da antologia com o escritor Vladimir Maiakovski eu achei que seria exagero. Não é! O poema aqui transcrito comprova isso. Tanto é que o mesmo se aproxima do já muito conhecido "E então, que quereis?", daquele poeta.


Aqui neste poema, ao escolher o título "Meio-dia", o poeta faz um elo entre os turnos da manhã e coloca o eu-lírico num horário de "rush", mais precisamente em um restaurante. Tudo bem apropriado para os dias atuais, onde na vida corrida, vai cada um no intervalo de almoço para suas respectivas mesas, para seus respectivos restaurantes. É tamanha a vida solitária que o ser fica com o olhar fixo naquele prato de comida em uma hora nem tanto apropriada.
Ao refletir, o poeta resolve agir, pois toda reflexão deveria ser reação...
Tantos planos, tantos afazeres. Há mesmo tempo para pensar? E é talvez ao mastigar o almoço, sozinho e pensativo que a reflexão encontra uma sobra de tempo. Há centenas de coisas e o barulho e correria do mundo moderno impede a calma. Não há tempo a perder, né?
Não há mesmo.
Peça logo a conta...


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ÁLVARO SANTI

Nasceu em Lajeado/RS, em 1964. Mestre em Letras (1999) e Bacharel em Música (1993) pela UFRGS, é assisten­te técnico da Secretaria Municipal da Cultura de Porto Ale­gre (SMC), onde coordena o Observatório da Cultura.
Lançou em 2007 o poema dramático A aposta dos deuses: ou Nietzsche, quem diria, acabou em comédia (ed. Independen­te), seu quarto livro de poesia, sucedendo a Dança das pala­vras (IEL, 1998), O primeiro anel (SMC, 1996) e Viagens de uma caneta por meus estados de espírito: poemas escolhidos (UFRGS, 1992) – este premiado com o Troféu Armindo Trevisan/Prê­mio UFRGS de Literatura; além de participação em várias antologias. Publicou ainda o ensaio Do Partenon à Califórnia: o nativismo gaúcho e suas origens (UFRGS, 2004). Como compositor e intérprete, lançou em 2011 o CD Trem da Utopia. Participou também de festivais no interior do RS e compôs trilhas sonoras para teatro. 

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